12 de outubro de 2008

ETILISMO

Na gaveta, dormindo
sob cartas e poemas,
o revólver aguarda.
_Ruy Espinheira Filho


De olhar russo e sotaque alemão
ele vem na contramão do seu destino.
Carrega um menino que pinta ser homem,
suado e cansado, na trama da arte.

Parte, curvilíneo e uniforme,
como que desviando dos males do mundo.
Trôpego na sofreguidão do abandono,
cochila sua realidade no sono do bar.

A velha rotina: prende o ar, concentra,
e vira! Sua sina rasga goela abaixo.
Vodca é sua predileção nas noites frias
em que, com demasia, lembra suas dores.

Amores, família, amigos... Já não tem
quem lhe abrace forte no Natal.
Não que isso seja a falta principal,
mas de fato, ser só no mundo, é fardo.

Olhares atentos em sua chegada
ensaiam aplausos pro seu espetáculo.
Afinal, por trás de um bêbado hálito
há sempre uma tragédia a se encenar.

Parte para sua casa desacompanhado
e a falta de si quase nem é notada.
A hora datada: uma e meia do nove de maio;
belo dia de partida... Resolve ir.

Apanha seu revólver calibre dezoito,
herança de seu avô militar.
E decide por um fim na noite mansa;
convida pra dançar a Morte; dispara.

Antes que a tara suicida lhe goze na cara,
ele se retorna, se repara; regressa!
Interrompido por um comentário sem valor,
ele xinga 'Desgraça!' sem pudor e cospe!

-Acorde, senhor, o bar fechou há dez minutos.

(Max da Fonseca)

6 comentários:

Eloah Borda disse...

Max, um tema forte, e muito, muito bom, e encerrado com chave de ouro, como se costuma dizer. Parabéns, meu amigo.
Bjs.

Gerana Damulakis disse...

Muito bom. Sempre passo por aqui e encontro textos cada vez melhores. Parabéns!

Bruna Rocha disse...

Nossa senhora!

Bruno_-_-_ ideias do outro eu disse...

Muito boas palavras Sr. Max!

thiê disse...

Muito bom!

Thiers Rimbaud disse...

Em cima de uma frase; do jeito q gosto. vc retrai a palavra. Digita a letra indecente, Furtiva e escandalosa morte. O toque( aquele q esperavas). Corta a tragédia ou será a espera!

Max é um poet adulto.

Bravo!


A Xícara está de pé!